Cegos que conseguem ver.
Milagre naquela época, miséria na
nossa.
Todos com vista, todos atentos a
tanto, mas não a tudo. Não a Ele.
Não consigo apreciar o simples, o
humilhado parece-me desfocado.
Não acabo de focar o alheio, nem
quase vislumbro o pequeno.
Então sou cego.
Cego de coração. Cego do
essencial, tão invisível aos olhos...
Passam os dias, e achando ver,
não vejo que nada sinto.
Mas o teu dedo roça-me apenas e
já vejo.
Unta com esse lodo teu este barro
que eu sou!
Que não desprezo esta vida, mas
desejo outra vista!
Abertos os olhos, observo vidas
alumiadas por tua Luz...
Creio, Senhor!
In Silencios Guiados -
Valladolid, 2008.
1 comentário:
"Os críticos podem dizer que determinado poema, longamente ritmado, não quer, afinal, dizer senão que o dia está bom. Mas dizer que o dia está bom é difícil, e o dia bom, ele mesmo, passa. Temos pois que conservar o dia bom em memória florida e prolixa, e assim constelar de novas flores ou de novos astros os campos ou os céus da exterioridade vazia e passageira."
FERNANDO PESSOA ( O livro do desassossego)
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